Um pouco do que aprendi até aqui sobre compartilhar conhecimento.

Sempre gostei muito de mexer com tecnologia. Tivemos o nosso primeiro computador em casa quando eu tinha cerca de 12 anos. Mas mesmo antes disso, eu já me aventurava num Windows 95 que ficava no escritório do trabalho do meu pai. Achava fascinante dar comandos específicos para o computador e conseguir rodar um jogo como ‘Prince of Persia’.

Fui da privilegiada geração que podia riscar discos de vinil brincando de DJ, gravar músicas que gostavam de ouvir em rádios dentro de fitas cassete e programas de TV em VHSs, brincar bastante ao ar livre (e disso eu não posso reclamar) e fazer pesquisas escolares em livros como a enciclopédia Larousse Cultural que meu pai havia comprado ao longo de muitas semanas junto com uma edição semanal de um jornal impresso. Era muito prazeroso folhear esses livros sem compromisso nenhum de aprender nada – a questão é que nesse processo acabei aprendendo muito.

Pouco tempo depois do nosso primeiro computador, meus pais me inscreveram num curso de manutenção de computadores. O curso era no SENAI em uma cidade que, de trem, ficava a pouco menos de uma hora de viagem.

Ver pessoas que resolviam problemas com linhas de comando, que limpavam todas as configurações de um computador – claro que com muitos disquetes e muita paciência – me entusiasmava muito. Mais do que isso, ver como os alunos contribuíam para um ambiente de aprendizagem tanto quanto o instrutor do curso me fez ver que o modelo de ensino usado nas escolas comuns poderia melhorar muito se o ambiente fosse de mais colaboração e compartilhamento e menos lousa e cópias em cadernos. É uma pena que demorei muito tempo para conseguir explicar isso aos meus professores e aos meus pais.

Fui um aluno nada excepcional. Sempre levemente acima da média, sem realizar sérios esforços para me destacar também. Afinal me destacar significava copiar tudo, como todo mundo fazia, e eu preferia muito mais conversar sobre os assuntos em pauta, quaisquer que fossem eles.

Nisso acabei consumindo muito conteúdo audiovisual na TV Escola, que é um canal do Ministério da Educação voltado mais para os professores, para ajudá-los a desenvolver planos de aula e a abordagem da ementa em sala de aula. Tirava tanto proveito das discussões entre os docentes na mesa quanto dos documentários em si.

Aos 18, enquanto cursava o SENAI de Eletrônica, vi que alguns alunos foram chamados para um processo de seleção para uma vaga de emprego. Nessa época apenas havia feito freelances de manutenção de computadores.

Perguntei para esses colegas se eu poderia ir com eles, apenas para saber como era o ambiente do processo de seleção, e descobrir como as coisas funcionavam e o que eles falaram para que, quando em algum dia futuro eu fosse chamado para algo assim, eu me baseasse naqueles que deram certo.

Chegando lá, quando falei que eu estava só acompanhando meus colegas para saber como funcionava um processo de seleção, a funcionária da consultoria de RH na recepção me perguntou se eu não tinha interesse em participar também. Claro que aceitei.

A vaga era para atendente de suporte técnico, em uma das contratadas de uma grande empresa de telefonia e internet.

Fiz uma pequena prova escrita de alguns conceitos simples, onde a grande maioria foi aprovada.

Lá em 2007 não existia o termo ‘soft skills’ mas já pude ver lá a diferença que essas habilidades intra e interpessoais fazem. Alguns colegas demonstraram impaciência ao tentar explicar alguns termos, ou se referiram a ter que ajudar parentes ou amigos com assuntos de tecnologia como algo cansativo ou irritante. Esses foram os que ficaram pelo caminho.

Passei pelas peneiras todas e, quando percebi, estava com a lista de documentos para abrir uma conta no banco e iniciar o trabalho. O salário era modesto, mas para um garoto que chegou ali sem pretensão nenhuma foi uma conquista e tanto.

Foi aí que comecei a ver como a colaboração e a troca de experiências contribuía muito para um desempenho excepcional – tanto quanto, ou até mais, do que o treinamento formal. Havia algumas pessoas que eram referência em alguns assuntos técnicos do nosso trabalho. Essas pessoas, em sua maioria, tinham o mesmo cargo que nós. Entretanto, o fato de elas serem acessíveis e terem facilidade em compartilhar seus conhecimentos com outros as destacava. Mas percebi também que, quanto mais elas compartilhavam, mais os outros estavam dispostos a compartilhar com elas coisas novas que eles aprendiam, e isso tornava o conhecimento dessas pessoas ainda maior.

Pude ver ali que a máxima de que “quem ensina, aprende ao ensinar”, citando Paulo Freire, se mostrou muito verdadeira.

Outra lição valiosa aprendi quando me ensinaram um comando feito no prompt de comando do Windows que se chamava NET SEND no Windows XP. Nele, você específica um endereço de rede (hostname) e digita uma mensagem, que aparece num popup no computador do destinatário. Um detalhe que aprendi depois é que, além de você mandar mensagem para um computador específico da rede, você pode também disparar mensagens para todos. Quando fizeram isso, a sala de controle da operação também recebeu a mensagem, e fomos chamados pela supervisão local para dar satisfações.

Todos nós, com poucas semanas de casa, fomos à sala de controle apreensivos sabendo que, na melhor das hipóteses, seríamos repreendidos. Entretanto, enquanto os colegas envolvidos procuravam criar desculpas ou dizer que não estavam envolvidos, eu me virei para a supervisora e expliquei que, como havia bloqueios de rede para utilização do MSN Messenger (que era o sistema de mensageria instantânea mais popular naquela época), uma forma de conversar com pessoas que estavam do outro lado da operação era bem útil mas que, como a chance de gerar problemas como aquele era grande, a gente iria parar de usar esse recurso. Nesse momento, aquela apreensão toda acabou. O que era um problema virou uma oportunidade de se posicionar e apresentar uma oportunidade de melhoria. Valia a pena dar um passo à frente em situações onde os outros recuavam.

Cerca de oito meses depois, assumi a supervisão de uma equipe de aproximadamente 30 pessoas. Eu tinha 19 anos. Para mim, foi mais um momento de muita insegurança e aprendizado, principalmente por saber que praticamente todos eram tecnicamente superiores, mais velhos e com mais tempo de casa que eu. Meu foco então era pensar em conhecer os processos que envolviam meu papel como supervisor e propor melhorias, facilitando a vida do meu time.
Fiz uma proposta de melhoria num fluxo de trabalho sobre serviços que enviávamos a campo e dois meses depois de assumir à supervisão fui convidado para integrar o time de gestão de qualidade, com o desafio de mapear todos os backoffices, desenhando os fluxogramas de suas atividades. Não teria mais equipe – nem a parte variável do salário correspondente ao desempenho da equipe. Mas topei o desafio pensando na possibilidade de entender o negócio com mais profundidade.

Após concluir o mapeamento e algumas outras grandes tarefas na área de qualidade, em poucos meses começamos a montar uma equipe focada na Gestão da Informação, que cuidaria dos relatórios de gestão da qualidade e de indicadores contratuais e da produção de aplicações locais para gestão. Em 2009, tínhamos um contrato baseado em performance com a empresa de telefonia que era nossa contratante, com um indicador principal de desempenho composto por várias métricas que garantiria que a solicitação do cliente era solucionada no primeiro contato com nossos canais de suporte sempre que possível.

Passamos a introduzir o conceito de auto-gestão, onde cada técnico conseguiria ver seus resultados e, além disso, conseguiria entender em qual métrica ele poderia melhorar para garantir sua variável de desempenho ainda naquele mês, com informações em D-1 (até o fechamento do dia anterior).

Para mim, trabalhar na construção desse time e ficar à frente dele nos pouco mais de dois anos seguintes foi algo incrível, e me ajudou não só a aprender como trabalhar com pessoas com perfis bem diferentes – tínhamos analistas de banco de dados, analistas de processos e desenvolvedores de níveis diferentes de especialização – mas a aprender novas técnicas e conceitos que transformariam minha mente dali em diante.

Éramos uma área de desenvolvimento de guerrilha – uma equipe local, descolada dos padrões corporativos, onde tínhamos liberdade para pensar em soluções que não eram nem cogitadas pelo alto escalão do TI, pois eles tinham questões mais complexas para lidar e não tinham proximidade suficiente do negócio para trabalhar nesses desenvolvimentos.

Sou muito grato a esse time pela quantidade de coisas que aprendi. Ainda em 2010, um dos membros da equipe começou a falar sobre os termos Scrum, XP (eXtreme Programming) e agile – conceitos de gestão de projetos que vi ao longo dos anos seguintes se popularizar entre desenvolvedores e, em anos mais recentes, entre os negócios de forma geral.

Outro grande aprendizado foi a programação. Eu considero essa uma das maiores transformações pessoais pelas quais passei na minha carreira profissional. Entretanto, não me considero um bom programador – na verdade, nem me considero um programador, no geral. Mas o desenvolvimento de pensamento lógico e a possibilidade de criar protótipos e sistemas funcionais me ajudou muito daquela época em diante. Como sempre digo, o pensamento de tecnologia, da lógica de programação, de análise de dados e afins são ferramentas poderosas no “cinto de utilidades” de qualquer profissional, em qualquer área de negócios e o destaca como ‘resolvedor de problemas’ – alguém que é capaz de pensar em soluções para áreas variadas do negócio, tornando-o muito versátil e com uma visão mais global e integrativa.

Em dois anos nessa área, pudemos desenvolver novas interfaces para o portal de gestão da informação daquela diretoria, melhorar alguns sistemas legados, melhorar processos e implantar novas funcionalidades.

Uma dessas novas funcionalidades foi um blog onde postávamos textos de nossa autoria – afinal éramos os donos do sistema, e o conceito de compliance e comunicação corporativa ainda era algo que tínhamos que aprimorar. Isso fica bem perceptível no episódio a seguir:

Certa vez, escrevi um texto falando que discordava de quem ficava só falando que as condições eram ruins, mas não fazia nenhuma proposta de melhoria. Falei que o mercado estava aí, aberto para quem não estivesse satisfeito com a empresa. Minha ideia era fomentar nas pessoas a vontade de causar mudanças positivas, mas definitivamente não me atentei ao tom das minhas palavras e não pensei no público-alvo que leria essa postagem. No mesmo dia fui questionado por um dos gerentes da operação sobre esse tal blog e quem havia escrito esse artigo. Aprendi ali bastante sobre ser ponderado na maneira que me expresso. Mas considero aquele dia também como sendo muito positivo pois, apesar de terem chamado minha atenção sobre o que escrevi, percebi que precisávamos de muito pouco tempo para uma matéria viralizar (o termo “viralizar”, inclusive, começou a ser difundido naquela época), e o impacto que poderíamos ter apenas compartilhando conhecimento e opiniões poderia ser gigantesco, mesmo se tratando de um canal interno de comunicação numa diretoria relativamente pequena – com cerca de 7 mil colaboradores.

Além dos novos aprendizados que tive com essa equipe, tive ótimos mentores que não tinham o menor problema em compartilhar dicas valiosas para me ajudar a liderar a equipe com leveza, gerenciar conflitos, inovar e me relacionar com todo tipo de partes interessadas, gerando sempre um grande impacto no negócio.

Um desses mentores me convidou certa vez a uma palestra no Shopping Villa Lobos, de um palestrante (Ricardo Jordão Magalhães, da BizRevolution) que usava filmes de Hollywood para ensinar lições para o mundo dos negócios. A palestra em si foi interessantíssima. Tanto que fomos em diversas outras posteriormente, pois entendíamos que esses insights iriam nos tornar melhores e nos ajudariam a ter uma nova abordagem nas nossas próprias atividades na empresa e em como conduzíamos nossos times.

Mas algo mais das palavras daquele palestrante me chamou muito a atenção. Ele dizia que metade do tempo dele era dedicado a produzir e disseminar conteúdo gratuitamente. De fato, essas palestras que aconteciam na Livraria Cultura – que, por sinal, está em recuperação judicial desde 2018 – e esse palestrante não cobrava um centavo sequer por essas palestras. Além disso, ele mantém até hoje um blog, uma newsletter, vídeos frequentes no YouTube e por aí vai.

Isso também criou em mim o desejo de compartilhar conhecimento. Comecei a escrever um blog (inovacao.blog.br – o domínio ainda é meu, mas descontinuei o blog após dois anos do seu início, por questões de tempo para pesquisa e escrita). Nesse blog, que chegou a ser mencionado em publicações e periódicos sobre inovação como uma referência sobre o tema, eu e mais alguns autores postavam artigos sobre startups, arquitetura, tecnologia, saúde e tendências de inovação. Foi uma experiência enriquecedora que me ensinou não só a escrever melhor – que é algo que tenho tentado trabalhar até hoje – mas também a pesquisar, fazer curadoria de conteúdo e sintetizar ideias para um post simples e fácil de ler.

Finalizei meu período nessa empresa em 2012, acreditando que não havia mais grandes mudanças que eu poderia provocar e que sair representaria crescimento pessoal em alguns aspectos da minha vida.

Fico muito feliz e satisfeito de ver que parte dos membros daquele time continuaram aquele legado e modelo de trabalho, e que o disseminaram dentro da empresa.

Também acompanho até hoje muitos dos colegas que saíram da empresa e vejo que aqueles que tinham maior disposição em compartilhar conteúdo tiveram um crescimento mais expressivo – e isso também foi um grande aprendizado para mim.

Passei um ano fazendo freelances de desenvolvimento para web – basicamente sites e sistemas simples. Foi um período que me fez valorizar ainda mais aqueles se dedicam para tocar seu próprio negócio.

Nessa época também aprendi muito com um amigo que mantém até hoje uma empresa de outsourcing de suporte a TI. Ele me indicou alguns clientes e pude acompanhar mais de perto o processo de negociação, execução de demandas, gestão de prazos e outros desafios que só alguém que é uma empresa de um homem só sabe. Ele é para mim um exemplo de serenidade, autocontrole e bom relacionamento até hoje.

Algumas dessas histórias estarão detalhadas ao longo das minhas postagens à frente.

Em 2013 fui chamado para um concurso para o qual nem me lembrava mais de ter aplicado para a prova. É nessa empresa que estou desde então, construindo histórias para acrescentar nessa jornada e levando adiante a missão de ser compartilhador de soluções com as pessoas que estão ao meu redor. As lições aprendidas nessa jornada atual ainda estão em constante desenvolvimento, e um dia também estarão nesse texto.